Número 3 - Ano I - Edição fechada em 13 de Dezembro de 2002 Florianópolis-SC
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Lagoa da Conceição: freqüência de acidentes com jet-skis tira sossego dos banhistas e esportistas / Foto: Ruy ExelCom a proximidade da alta temporada de verão, os turistas que buscam as 42 praias de Florianópolis para usufruir as férias terão mais um motivo para se preocupar além dos
locais impróprios para o banho. O número de incidentes envolvendo embarcações, banhistas e praticantes de esportes náuticos estão mais freqüentes. As autoridades competentes não conseguem controlar os abusos cometidos por quem trafega com lanchas ou anda de jet-skis, principalmente na Lagoa da Conceição, onde o aumento do número de embarcações vêm causando preocupação para os moradores locais.

Na falta de uma legislação coerente para o tráfego de embarcações e de uma fiscalização que impeça os abusos, os freqüentadores das praias tentam manter a ordem. Em Ponta das Canas, banhistas obrigaram um turista exibicionista a retirar seu jet-ski da água, no último domingo de novembro. Após trocarem ofensas mútuas, a família do dono do jet-ski foi obrigada a se retirar do local. Testemunhas afirmam que a discussão começou porque o piloto estava fazendo manobras perigosas, e quando advertidos por banhistas exigindo que mostrassem a carteira de habilitação para jet-ski, negaram. Esse conflito não é um caso isolado. Uma semana antes, o Grupo de Busca de Salvamento (GBS) do Corpo de Bombeiros da capital foi chamado para apaziguar a briga entre o condutor de uma lancha e um praticante de windsurf na Lagoa da Conceição, na mesma semana em que houve a manifestação em homenagem a Felipe de Paula Queiroz, estudante morto por uma lancha no mesmo local, enquanto praticava kitesurf. A morte de Felipe de Paula Queiroz está sendo apurada pelo Ministério Público, que indiciou o piloto da lancha, Nestor d’Azevedo Lemos, por homicídio culposo. Mas os praticantes de esportes náuticos na Lagoa não se sentem seguros.

Enquanto apenas nos acidentes graves os policiais são chamados para registrarem a ocorrência - pois os registrados esse ano ainda estão à espera de uma conclusão judicial - cada vez mais pessoas acumulam histórias de desrespeito de condutores de embarcações. Sidney Nieto, 45 anos, gostaria que qualquer tipo de embarcações a motor fosse proibido na Lagoa. Praticante de windsurf há dois anos, alega que “há lanchas que passam aqui (Lagoa) que impedem que se veja se tem uma pessoa nadando na frente”. Ele se refere a lanchas de grande porte que transitam na Lagoa da Conceição. Nieto recorda de um caso que aconteceu no início do ano, enquanto estava com os amigos no bar Capitão Fortaleza, que fica sobre a água do canal da Barra. “Para querer se mostrar”, conta “o cara da lancha fez marola para molhar o pessoal que estava no bar”. E enfatiza que na Lagoa “o problema é o barco a motor”.

Clodoaldo Amandio, 29 anos, tem outra opinião, é a favor dos barcos. Marinheiro profissional, Clodoaldo trabalha há quatro anos na marina Ponta da Areia. Ele comenta que após a morte do praticante de kitesurf, “se parar com a lancha na Lagoa eles (praticantes de windsurf) vem para te bater”. Defende o uso de lanchas no local dizendo que “tudo na Costa depende do transporte em lancha”. Cita que, “antigamente, se alguém sofria um enfarte na Costa da Lagoa, vinham aqui na marina requisitar uma lancha para o socorro. Pela lei da Marinha, o dono é obrigado a fornecer a embarcação. Hoje em dia os bombeiros fazem o serviço. As pessoas que são contra a lancha não fazem idéia de quantas vidas já foram salvas dessa forma”. Mas concorda que uma lancha considerada de grande porte para a lagoa não trafega na velocidade regulamentada pela portaria da Capitania dos Portos (nº 004/96, de 1º de outubro de 1996) que limita a velocidade de embarcações na lagoa (máximo de 10 nós de velocidade durante o dia e 5 nós à noite) e no canal da Barra -máximo de três nós.

Lanchas consideradas de grande porte para a Lagoa da Conceição apresentam alguns problemas ao andar abaixo de três nós. Uma (lancha) Chris Craft de 260 cavalos não chega a andar abaixo de 10 nós”, adverte Amandio, e “se andar muito devagar na lenta, a refrigeração do motor não funciona, a embarcação começa a apitar, alertando superaquecimento”. O condutor da embarcação precisa deixar o motor em alta rotação para fazer a bomba sugar a água para esfriar o motor, para que ela seja evacuada. Outro fator é a necessidade da lancha evoluir numa velocidade acima de 10 nós para nivelar a lancha na água, baixando a proa. Se andar dentro do limite regulamentado, o piloto desse tipo de embarcação perde a visibilidade. “Por isso existem bóias nas marinas definindo o trajeto que a lancha usa quando sai da marina e quando vai atracar”, diz Amandio. Apenas nas marinas da Lagoa da Conceição existem aproximadamente 150 lanchas de grande porte. A Capitania dos Portos não tem cifras do total de embarcações que transitam na Lagoa da Conceição durante a alta temporada, mas estima-se que seja superior a mil unidades, sem contar com jet-skis, pranchas de windsurf, caiaques e pedalinhos.

Uma das providências vão ser tomadas para evitar que ocorram outros acidentes envolvendo embarcação na lagoa será a instalação de uma linha de bóias distantes 200 metros da margem delimitando a área para banhistas, como já foi feito nas praias Daniela e Ponta das Canas no verão passado. O tráfego de embarcações dentro da área reservada aos banhistas só será permitido se a velocidade for abaixo dos três nós e caso esteja manobrando para atracação. A decisão foi tomada após duas reuniões com representantes da Associação Comercial e Industrial de Florianópolis (ACIF) da Lagoa da Conceição, escolas de esportes náuticos, marinas, Associação dos Moradores da Lagoa (Amola) e o Comitê de Gerenciamento da Lagoa. Desses encontros surgiu um documento com sugestões de leis para a regulamentação do uso da lamina d’água da Lagoa da Conceição, e que será entregue para a Capitania dos Portos de Florianópolis e à prefeitura. Um dos pontos polêmicos é o pedido de proibição do jet-ski na Lagoa da Conceição, como foi feito na Lagoa Rodrigo de Freitas, (RJ), onde é proibido o tráfego de jet-ski.

Este ano, foram registrados no 10º Distrito Policial, na Lagoa, dois acidentes envolvendo jet-ski, que causaram ferimentos graves em duas pessoas e uma morte. Após os acidentes, um abaixo-assinado, contendo mais de cinco mil assinaturas, foi entregue à prefeitura pela Associação Amigos da Lagoa (Amola) solicitando a proibição do veículo aquático. Foi proibido apenas o aluguel de jet-ski em Florianópolis. “O jet-ski não é um esporte para ser praticado na Lagoa”, diz Aurélio Bertuliano de Oliveira, 57 anos, presidente da Amola. Ele conta que em 1992 já havia sido enviado um documento à Capitania dos Portos pedindo providências para regulamentação do tráfego de embarcações na Lagoa e a proibição do jet-ski. “A Lagoa precisa de um plano diretor que limita o número de embarcações”, brada. Seu “Lelo”, como é conhecido, é nativo da Lagoa e um dos primeiros moradores do bairro. Não sabe especificar quantos incidentes com jet-ski já presenciou ou foi informado, mas guarda recortes dos que foram publicados nos jornais.

Mas indicou profissionais que poderiam informar melhor. Um deles, Rubens Laureano, barqueiro da Cooperbarcos, empresa que oferece passeios marítimos, conta que já teve problemas com condutores de jet-ski. “As ocorrências começam depois de dezembro, na época de alta temporada”, relembra Laureano. Barqueiro há 14 anos, conta um dos casos. Ele atracava o barco para que os turistas desembarcassem do passeio “quando um jet-ski deu uma guinada para molhar os passageiros. Eles correram atrás para linchar o cara, mas ele atracou na marina próxima e fugiu de carro”. Quando questionado se tinha feito queixa das provocações, na polícia ele respondeu que “a gente nunca registrou ocorrência nenhuma”.

O delegado João Ramos Gentil do 10º DP, diz que tais provocações podem ser registradas como condução perigosa, mas lamenta que é difícil localizar o condutor do jet-ski, caso não tenha sido se não for pego em flagrante cometendo o delito. “E mesmo quando é identificado, faltam com o respeito”, alega Gentil. Ele conta que há alguns anos, enquanto estava de folga, caminhava pela praia dos Ingleses, de bermuda, quando encontrou um casal fazendo peripécias com um jet-ski. “É uma praia onde quase sempre há crianças brincando”, diz. Decidiu intervir se apresentando como delegado. “O pessoal duvidava da autoridade. E daí, se era ou não delegado. É um dever de cidadão”. Foi obrigado a chamar uma viatura policial.

Toda embarcação apreendida em Florianópolis, seja porque está em situação irregular ou sendo usada de maneira irregular, é encaminhada à Capitania dos Portos no Estreito. E lá há dois jet-skis apreendidos este ano. Um deles, depois que seu condutor foi abordado na Lagoa para inspeção, escapou seguindo em direção à praia, atracou na areia, e fugiu num carro. O aparelho vai permanecer na Capitania dos Portos até ser posto em leilão, ou o dono ir buscá-lo. “A grande maioria dos jet-skis são de pessoas do interior do estado ou de outros estados. Trazem em pick-ups ou carretas, e colocam na água nos locais menos fiscalizados. Há pessoas que desembarcavam o jet-ski na praia da Daniela para ir para Ingleses”, conta o comandante Barbejat, há dois anos no comando da Capitania dos Portos de Florianópolis. Ele garante que “quem não está com o jet-ski regulamentado, não coloca o Veículo na Lagoa”.

Um outro jet-ski apreendido pela Capitania dos Portos foi usado por uma menina de 13 anos, que, ao perder o controle da embarcação, colidiu contra a Marina da Lagoa e sofreu fratura exposta, no dia 10 de janeiro deste ano. Ela estava de férias com a família. “Eles estavam no restaurante Gang da Fruta e tinha um jet-ski fazendo marola desde as dez da manhã. O acidente aconteceu às três da tarde”, comenta Henrique Ramos, 45 anos, arrendatário da marina localizada na avenida das Rendeiras. Henrique não é contra a proibição dos jet-ski na Lagoa, mas a favor de uma regulamentação mais eficaz. Conta que “o pessoal que vem de fora sempre usa aquela rampinha” – aponta Henrique, referindo-se a Rampinha do Pitoco, na rua Afonso Delombert Neto – para colocar as embarcações na Lagoa.

Segundo consta na lei n° 4601/95 que regulamenta a atividade náutica de lazer nos balneários de Florianópolis, para conduzir uma embarcação é necessário ter acima de 18 anos, ter habilitação, usar material de segurança apropriado e ter registro da embarcação na Capitania dos Portos. Mas está em discussão, colocadar placas educativas, inclusive na rampinha do pitoco, para que todos fiquem sabendo do regulamento das embarcações, como prevê o projeto de lei do vereador Alexandre Fontes (PPB), já que a Capitania dos Portos dispõe de apenas 58 fiscais na época da alta temporada, para fiscalizar as praias da ilha e do continente de Florianópolis. Nesse trabalho colaboram os aprendizes de marinheiros da Escola da Marinha

Wagner Maia

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