Número 1 - Ano I - Edição fechada em 29 de Julho de 2002 Florianópolis-SC
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Comoção no Rio: população se manifesta em ato pelo repórter, que começou no Leblon e terminou no Arpoador / Foto: Motta - AEO jornalista Tim Lopes, repórter da rede Globo morreu, no dia 03 de junho, brutalmente assassinado por traficantes, quando fazia uma reportagem sobre tráfico de drogas e exploração sexual em um baile funk na favela Vila Cruzeiro, no subúrbio do Rio de Janeiro. O repórter estava exercendo sua profissão perigosamente, em uma zona de conflito, dominada pela guerra não declarada do narcotráfico, na cidade. Como Tim Lopes outros tantos jornalistas no mundo se arriscam e morrem no trabalho de campo. O Comitê de Proteção aos Jornalistas (CPJ), com sede em Nova York, divulgou que no ano de 2001, foram mortos 37 jornalistas em vários países sob circunstâncias violentas.

Na Europa, o medo é que o exemplo colombiano de violência contra repórteres atinja o Brasil. Segundo a organização francesa Repórteres Sem Fronteiras (RSF), que defende a liberdade de imprensa, a América do Sul é hoje o lugar mais perigoso para exercer a atividade jornalística, sobretudo a investigativa. Seqüestros, emboscadas e assassinatos contra jornalistas aumentaram 50% no ano passado. A maioria destes crimes foi praticada por vingança de corruptos e traficantes de drogas. Dos 37 jornalistas mortos em todo o mundo no ano passado, 18 pertenciam à América Latina. A maior parte dos jornalistas são da Colômbia, com 10 assassinados. Também aumentou o número de jornalistas processados por criticar atos do governo: 489 foram presos nos países governados por ditadores, sendo que 110 continuam na cadeia e 380 foram vítimas de censura.
De acordo com a Sociedade Interamericana de Imprensa, SIP o número de vítimas do ano passado é o maior desde 1997, mas houve diminuição em relação a média anual de 1989 até 2001, com 19 mortes. Na última década, segundo dados do CPJ, já se contabilizam 389 mortes, sendo que 16% dos jornalistas foram mortos em fogo cruzado e 77% assassinados. Desde 1992 foram confirmadas 30 mortes de jornalistas na Colômbia, enquanto no Brasil morreram dez profissionais, vítimas de atentados.

O memorial norte-americano Freedom Forum, uma imponente espiral de vidro e aço que sobe alargando-se em direção ao céu, no pátio do Museu da Notícia, em Arlington, Washington é dedicado aos profissionais que morreram em coberturas de guerra, catástrofes ou foram vítimas de violência. Em números absolutos, para o monumento do Freedom Forum Journalists Memorial são 1.086 jornalistas assassinados no exercício da profissão. O primeiro da lista é James Lingan, do Federal Republic, morto em Maryland, Estados Unidos, em 1812. No próximo Dia Mundial da Liberdade de Imprensa - 3 de maio de 2003 - o nome de Tim Lopes será escrito no memorial de Washington. Será o 22º brasileiro na lista de jornalistas mortos no exercício da profissão.

O assassinato do repórter Tim Lopes também motivou a manifestação de diversas entidades no Brasil e no mundo. A Associação Brasileira de Imprensa, a Associação Nacional de Jornais, a Ordem dos Advogados do Brasil, entre outros, consideraram o caso uma ameaça à liberdade de imprensa. Lena Williams, do jornal New York Times, lembrou a morte de Daniel Pearl, repórter do Wall Street Journal, no Paquistão. Disse que a violência contra jornalistas não é mais restrita a coberturas de guerras, mas também faz parte do cotidiano.

Roy Gutman, da revista Newsweek, diz que a imprensa brasileira precisa ser solidária, ajudando a descobrir o que aconteceu ao jornalista. Linda Foley, presidente da Associação Mundial dos Jornais, acredita na mobilização dos brasileiros e acha que a população deve compreender que a violência contra um jornalista é um ataque à capacidade do povo de receber informação com credibilidade. Em Washington, nos Estados Unidos, o protesto veio do Museu da Imprensa. Para a diretora Margaret Engels, a América Latina é um dos lugares mais perigosos do mundo para exercer a profissão de repórter. Segundo a diretora, é preciso que as pessoas e o governo fiquem mais indignados.

Revolta e indignação não faltam para jornalistas e moradores do Rio de Janeiro. No dia 24 de junho, cerca de 300 manifestantes, fizeram uma caminhada na orla da Zona Sul da cidade para evitar que o caso de Tim Lopes não fique impune e para protestar contra a violência tantas vezes denunciada pelo profissional. Nacif Elias, presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio, lembra que somente com a pressão da sociedade, será possível reverter o quadro de violência no Brasil. Beth Costa, presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), presente na manifestação, disse que o caso repercute não só no Brasil como em todo o mundo. “A principal forma de os jornalistas contribuírem para o fim da violência é incluir nas reportagens propostas de soluções para o problema”, finaliza.


Tim Lopes: vitima da ousadiaO crime - A morte do jornalista Tim Lopes, de 51 anos, foi confirmada a Zaqueu Teixeira, chefe da Polícia Civil, na noite do dia 9 de junho pelos traficantes Fernando Satiro da Silva, “o Frei”, e Reinaldo Amaral de Jesus, o “Cabê”,. Eles negam a participação na morte do repórter. No entanto, contaram em detalhes a maneira como o jornalista foi levado pelos traficantes e seu assassinato. Tim Lopes saiu do baile funk na Vila Cruzeiro, por volta das 20 horas e foi até um bar, na Rua 8. Os traficantes Andro da Cruz Barbosa, o André “Capeta”, e Maurício de Lima Bastos, o “Boizinho”, perceberam uma luz que vazava de sua pochete e abordaram o jornalista. Descobriram a micro-câmera e, através de um rádio, entraram em contato com Elias Pereira da Silva, o “Elias Maluco”, que ordenou o espancamento do jornalista. Um dos traficantes mais procurados do Rio de Janeiro, Elias gerencia o tráfico na região e é o único líder da facção Comando Vermelho em liberdade.

Os traficantes atenderam as ordens de “Elias Maluco” e atiraram nos pés de Tim Lopes, para que não tentasse fugir, amarraram suas mãos e jogaram o jornalista dentro do porta-malas de um Fiat Palio. O repórter foi levado para o alto da favela da Grota, no Complexo do Alemão, um conjunto de favelas no Rio de Janeiro. Pouco tempo depois, Elias Maluco estaria diante do autor da matéria Feira das drogas, que denunciou, no ano passado, o modo como as drogas eram comercializadas nas ruas e que causou a prisão de Renato Souza de Paula, o “Ratinho”, como é conhecido na favela.

“Ratinho” tinha sido flagrado pelo jornalista no feirão de drogas. Ele foi filmado por Tim Lopes na reportagem, que deu ao jornalista o Prêmio Esso de Telejornalismo em 2001. Segundo a polícia, ele também usa o nome de Anderson Martins de Carvalho, e é um dos homens mais importantes do bando de Elias Maluco. Acusado de tráfico de entorpecentes e associação para o tráfico, é o responsável pelo fornecimento de munição para a Favela da Grota e foi o primeiro a sugerir a execução do repórter.

Elias acatou a idéia e ordenou que fosse feito um julgamento. Por quatro votos a zero, o jornalista foi condenado à morte. À meia-noite “Elias Maluco” pegou um sabre do tipo samurai e com um golpe fez um corte diagonal do ombro esquerdo até o estômago de Tim Lopes. O corpo foi esquartejado, incendiado no local chamado “microondas” pelos traficantes, e levado para um cemitério clandestino na Pedra do Sapo no topo da Favela da Grota – Complexo do Alemão.

O Laboratório de Bioquímica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) através do exame de DNA, confirmou, no dia 5 de julho, mais de um mês depois do desaparecimento de Tim Lopes, que os fragmentos enterrados no cemitério clandestino eram mesmo do jornalista. O material analisado foi um fragmento de costela encontrado no dia 12 de junho, junto aos restos da microcâmera que Tim carregava. Ao anunciar a confirmação do assassinato do jornalista, o delegado Zaqueu Teixeira, chefe de Polícia Civil, informou que vai pedir prorrogação do inquérito por mais 30 dias, para juntar laudos e outras provas, que garantam a condenação do traficante Elias Pereira da Silva e de outros sete acusados do crime, já indiciados, também por homicídio. “Não queremos que mais tarde a Justiça liberte qualquer um deles alegando falhas nas investigações. Como há indícios suficientes para se pedir a prorrogação da prisão temporária dos quatro suspeitos já presos, não vejo por que concluir o inquérito de forma apressada”, ponderou.


Autor intelectual - Considerado um dos traficantes mais violentos do Rio, Elias Pereira da Silva ou Elias Maluco, domina o Complexo do Alemão, região com mais de 65 mil habitantes e que inclui entre suas 13 favelas a Vila Cruzeiro e Grota Funda – onde Tim Lopes foi morto. Em 1996, o traficante cumpriu pena por tráfico de drogas durante três anos e 50 dias, mas ganhou liberdade em 2000, através de um habeas corpus. “É um bandido que tem todo o aparato de armas e bandidos a seu favor”, diz Marina Maggessi, chefe de investigação da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DER), ao justificar a dificuldade de prender Elias Maluco. Apontado pela polícia como o responsável pela distribuição de metade da droga vendida no Rio, é acusado de comandar um exército de mais de 300 homens. O secretário de Segurança do Rio, Roberto Aguiar, anunciou no dia 11 de junho que o valor da recompensa para quem der informações sobre seu paradeiro subiu de R$ 30 mil para R$ 60 mil. Desde o desaparecimento de Tim Lopes, a polícia tem recebido cerca de 80 denúncias anônimas por dia, referentes ao suposto esconderijo do traficante.

Camila Rutka

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