Número 1 - Ano I - Edição fechada em 29 de Julho de 2002 Florianópolis-SC
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Mentiras: fórmula calcada em sexo, fofoca e crimesBild, em alemão, significa imagem. E desde 24 de junho de 1952 virou sinônimo do jornal mais vendido do país, atualmente com uma tiragem de 4,5 milhões de exemplares. Inicialmente inspirado nos tablóides britânicos, o Bild completa 50 anos com uma receita própria de jornalismo. Vendido a 45 centavos de euro, é lido por cerca de 12 milhões de pessoas, e seu conteúdo é uma mistura de notícias sobre celebridades e reportagens policiais. Também não faltam títulos sensacionalistas e uma primeira página com fotografias de mulheres nuas. Fórmula que conquista um grande público, e faz dele um “diário para gente simples”, como resume Kai Dieckmann, diretor de redação, ao jornal português Público.

O jornal foi, durante anos, considerado pela esquerda um exemplo da imprensa reacionária e conservadora. Tanto, que no final dos anos 70, em pleno movimento hippie, se tornou famoso por suas campanhas contra os movimentos ecologistas e pacifistas. Sua linha editorial pró-americana e anticomunista lhe rendeu acusações de ser “o ópio do povo”. Quando os russos começaram a construção do muro de Berlim, o Bild manchetou: “O Ocidente não fez nada”

Ética na apuração jornalística nunca foi o forte do jornal. Pesam acusações contra o Bild sobre troca de favores políticos, já que alguns dos diretores e jornalistas do tablóide foram promovidos a cargos de assessores no governo alemão. O diário também é acusado de favorecer a vitória do primeiro-ministro Gerard Schroeder sobre Helmut Kohl nas eleições legislativas de 1998, quando publicou segredos de alcova do ex-chanceler. Mas as denúncias mais graves vêm do jornalista alemão Günter Wallraff, autor do livro Fábrica de Mentiras – publicado no Brasil. Wallraff revela que a redação do diário é uma “oficina profissional de falsificações”, e não usa um modelo de jornalismo investigativo, analítico ou ético como o do Le Monde ou Washington Post. “No Bild a realidade externa pouco importa, ela é inventada dentro do próprio jornal. As histórias são primeiro sugeridas (ou criadas) dentro da redação. O repórter vai para rua apenas para justificar a pauta dos editores”, acrescentou o jornalista brasileiro Marcos Faerman, que assina o prefácio de Fábrica de Mentiras.


Briga de cachorro grande - O cinqüentenário do Bild é marcado por disputas internas pelo poder. O magnata do setor de mídia Leo Kirch, que detém 40% de participação na editora Axel Springer, empresa que publica o jornal, acusa os membros do conselho diretor da empresa e seu principal acionista, Friede Springer, de enfraquecer o gurpo Kirch. A Axel Springer comprou US$ 760 milhões de dólares, 12% do capital da ProSibienSat Media, a maior rede de TV comercial da Alemanha, também controlada por Kirch.

Para a Axel Springer, a compra da participação na ProSieben foi o primeiro passo para transformar o grupo editorial num gigante da mídia. Atualmente a empresa é proprietária do Bild, do jornal conservador Die Welt, de jornais regionais cuja tiragem somada é de 1 milhão de exemplares e também de revistas. ‘O conselho ouviu Springer e desconsiderou o interesse da empresa e de acionistas menores’, diz Ronald Frohne, advogado de Kirch, lembrando que a editora também tem problemas financeiros e até o fim do ano pretende reduzir 14 mil vagas que equivalem a 10% dos postos de trabalho.

O grupo Kirch declarou falência este ano, com uma dívida estimada em 6,5 bilhões de euros (R$ 13,7 bilhões). É a maior bancarrota da história alemã desde a II Guerra Mundial, e 9.500 trabalhadores estão ameaçados de perder o emprego. A Kirch é uma das maiores empresas do ramo de comunicação do mundo, mas vem sofrendo nos últimos tempos, com maus investimentos feitos nas áreas de cinema e TV paga. As pesadas dívidas se devem principalmente à compra de direitos de filmes a preços exorbitantes e ao lançamento de um canal pay-per-view, o Premiére, num país com mais de 30 canais de TV aberta.

Antes de pedir concordata na Alemanha, a matriz da Kirch transferiu seus direitos de transmissão da F-1 e da Copa do Mundo de 2002 e 2006 para uma subsidiária, a KirchSport, que é totalmente baseada na Suíça. Caso a KirchSport também vá a lona, os direitos de transmissão da Copa, avaliados em cerca de US$ 1,67 bilhão, retornam para a FIFA.


Solução política - Os bancos estudam soluções para o problema. Edmund Stoiber, governador da Baviera, sede da Kirch, tem grande interesse em ajudar, pois a empresa desempenha papel importante na economia do Estado. Stoiber, conservador, usa a prosperidade econômica bávara para alavancar sua candidatura ao cargo de chanceler, atualmente ocupado pelo rival social-democrata Gerhard Schroeder. Este seria o motivo pelo qual o banco do estado emprestou 2 bilhões de euros à Kirch. “Falência não significa destruição da companhia, mas oportunidade e novos donos”, diz o político.

Outra solução seria Leo Kirch vender sua participação na Axel Springer. Não faltam interessados nos 40% de ações detidos pelo Grupo Kirch. Desde o magnata Rupert Murdoch até o grupo de imprensa WAZ. Dono de 28 diários regionais na Alemanha, com tiragem diária de 4,5 milhões de exemplares, e associado da Bertelsmann, segundo maior grupo de mídia do mundo, sediado na Alemanha.


Wendel Martins

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