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Recolhidos os panfletos,
bandeiras e cartuchos de fogos de artifício deixados
pelas ruas do país após a festa da eleição
de Lula, é hora de olhar novamente para os resultados
do primeiro turno, que definiu as bancadas no Congresso
Nacional. Afinal, o governo é muito mais que
o presidente, e sem uma ampla base parlamentar, será
difícil Lula cumprir as promessas de reformas
que convenceram tantos brasileiros a elegê-lo
chefe da nação. A oposição
aumentou bastante sua representação no
Congresso (só o PT cresceu 56% na Câmara
e 75% no Senado), mas apesar das baixas que sofreram,
PSDB, PFL, PMDB e PPB ainda detêm largas fatias
no Congresso. É hora de negociar.
Os partidos da coligação que elegeu Lula,
somados às legendas que apoiaram Ciro Gomes e
Anthony Garotinho no primeiro turno - e o PT no segundo
-, somam 212 cadeiras na Câmara. É pouco
em comparação com a maioria simples (50%
da casa), que corresponde a 257 parlamentares, e menos
ainda em relação à maioria qualificada
(60%), que é composta por 308 deputados, quantidade
de votos necessários para se aprovar uma emenda
constitucional. No Senado, onde a maioria simples é
41 e a qualificada, 49, a situação é
semelhante. A coligação de Lula (PT, PL,
PC do B e PMN), o PSB de Garotinho e a coligação
de Ciro (PPS, PDT e PTB) somam 30 senadores.
Yan
Carreirão, professor do Departamento de Sociologia
e Ciências Políticas da UFSC, avalia que
alianças devem ser feitas para que o governo
eleito consiga formar um bloco de maioria no Congresso.
Ele acredita que o PV – partido que não
apoiou nenhum candidato à presidência,
mas que está incluído entre os partidos
de esquerda e centro-esquerda – deve somar seus
cinco deputados ao bloco governista. O professor também
aposta na agregação dos pequenos partidos
de centro e centro-direita (PSD, PST, PSC, PSDC, PSL
e Prona), o que permitiria ao governo contar com mais
16 deputados e 1 senador. Mesmo assim, o bloco não
atingiria sequer a maioria simples em nenhuma das casas.
“O PMDB é a chave”, diz o professor.
Ele acredita que o partido, embora tenha sofrido uma
racha ao dividir no apoio a Lula e Serra, é fundamental
para a composição do bloco do governo.
Se Lula puder contar com os 19 senadores e 74 deputados
do PMDB, terá exatamente um parlamentar a mais
que a maioria qualificada em ambas casas, ou seja, 50
no Senado e 309 na Câmara. Os números,
assim, seriam ainda desconfortáveis para o governo.
“A reforma constitucional vai ser difícil
de aprovar”, diz o professor Carreirão.
E acrescenta, com ceticismo que “seria bom para
o governo e para o país que o PT atraísse
o PSDB”. A aliança, pouco provável,
criaria um bloco governista confortavelmente composto
por 61 senadores e 380 deputados. “Se o Lula está
se propondo a criar um pacto social, unindo empresários,
sindicatos e toda a sociedade, poderia tentar fazer
o mesmo no Congresso”, avalia. A possibilidade
foi considerada pelo PT logo após a divulgação
dos resultados do primeiro turno. Aloizio Mercadante,
o senador eleito por São Paulo, disse haver espaço
para o PSDB no pacto partidário, “do qual
ninguém seria excluído”.
Mas a formação de um bloco governista
forte também pode ser auxiliada por um fenômeno
comum na política nacional: as migrações
interpartidárias. Os votos para cargos no Legislativo
não contam somente para o candidato, mas também
para o partido - fato que muitos eleitores só
descobriram depois que o deputado federal eleito por
São Paulo, Enéas Carneiro, carregou consigo
mais cinco candidatos do Prona à Câmara,
isto não impede que, eleito, o parlamentar se
filie a outro partido. Segundo o professor Carreirão,
não é tradição do eleitorado
brasileiro “penalizar nas urnas” os parlamentares
que trocam de partido durante o mandato.
Ele acredita que as migrações mais prováveis
devem acontecer do PFL e do PPB para o PL, e do PSDB
para o PPS. E atesta que, os parlamentares tentam manter
um mínimo de coerência na escolha do novo
partido, buscando legendas que tenham uma certa identificação
com seu partido de origem. Como exemplo, cita os pefelistas
que ao se filiarem ao PL não estarão abandonando
a orientação liberal.
Para explicar o crescimento da oposição
no Congresso, aponta uma causa básica: o descontentamento
do eleitorado com o segundo mandato do presidente Fernando
Henrique Cardoso. A votação para a presidência
no primeiro turno foi um bom indicador dessa insatisfação:
os votos dos candidatos de oposição representaram
76% do total. E essa vontade de mudar se refletiu na
votação para o Congresso. Os partidos
que fazem oposição a FHC ampliaram em
média, 40%.
Apesar do crescimento notável da oposição,
menos da metade do novo Congresso será de novos
parlamentares. A taxa de renovação na
Câmara foi de 47%. No Senado, correspondeu a 75%
das 54 vagas disputadas, o que significa menos de 50%
do total de 81 cadeiras. A maior renovação
das últimas eleições aconteceu
em 1990, quando apenas 37% dos parlamentares se reelegeram. |
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