Número 2 - Ano I - Edição fechada em 21 de Novembro de 2002 Florianópolis-SC
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Festa de casamento, abril ou maio de 1978. Muitos ali se diziam de esquerda, alguns eram. Houve quem se queixasse com a súbita notoriedade de um certo Lula, metalúrgico e presidente do sindicato de São Paulo e Diadema. Pouco antes IstoÉ, que então eu dirigia, havia enquadrado na capa o rosto redondo e perigosamente bigodudo de Lula. Um mês depois o Pasquim não deixara por menos. Será que o homem merecia tanto cartaz?

A capa de
IstoÉ é de 1o de fevereiro daquele ano. Trazia o perfil da personagem e uma entrevista. Assinavam o texto Bernardo Lerer e este que escreve. Enxergávamos em Lula uma figura de grande porte, destinada a crescer. QI muito alto, vocação política pronunciadíssima, destino de líder, idéias simples e límpidas, sentimento idem. Um protagonista. Para a ribalta.

Formou-se uma roda de convidados para discutir Lula, unidos, arrisco, por vago intuito de cobrança. De patrulhamento preventivo. Não citarei nomes, para não criar constrangimentos. Vários são graúdos e um punhado virou petista. Perguntavam se IstoÉ e Pasquim não estariam a apostar errado, se o operário seria confiável, se ideologicamente sabia das coisas. Alguém aventou a hipótese de que fosse agente da CIA e outros anuíram, com a gravidade devida.

Na origem, o preconceito dos abastados. A festa acontecia em sítio senhorial, arredores de São Paulo. Os ideais ali proclamados eram reformistas, quando não revolucionários. Os hábitos burgueses. Não consegui ser convincente na defesa de Lula e dos meus pontos de vista. Com o tempo, tempo escasso, felizmente, convincente foi o próprio Lula. Dois anos depois estaria à testa de um partido, o primeiro no País que faz jus ao nome. Os demais, não escondem o parentesco com clubes e associações recreativas.

Naquela época eu tinha enormes esperanças, embora padecêssemos a ditadura. Acreditava que ainda veria raiar o sol da liberdade. Quando os militares – ou gendarmes da elite? – saíram de cena, o que esperava não se deu. Alvorecer não houve, quase dezoito anos a fio. Temi jamais chegar ao dia de hoje. Temi mesmo que não fosse previsto pelo calendário.

E então, o horizonte se ilumina, o Brasil tem uma chance excepcional de sair da Idade Média, graças àquele Lula em quem a gente apostou há vinte e quatro anos e meio. Não ousava imaginar este momento mesmo dois meses atrás, quem sabe menos ainda. Agora, é bom vivê-lo, no reencontro com a esperança que parecia perdida. É ótimo, para o jornalista e para o cidadão.

Mino Carta - Jornalista e diretor de redação da revista CartaCapital

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