Além
da sociedade não ter garantias de que o novo
sistema de transporte público de Florianópolis
trará benefícios, cobradores e motoristas
temem que ele possa causar desemprego. Sindicalistas
prevêem que a instalação de catracas
eletrônicas, diminuição da frota
e utilização de ônibus maiores vão
causar cerca de 500 demissões. Exemplos de cidades
como Chapecó e Caxias do Sul (RS), no Rio Grande
do Sul, mostram que é possível modernizar
o transporte público evitando o desemprego e
até criando novos postos de trabalho. Os motoristas
e cobradores de Florianópolis lutam por isso.
O decreto 1636, publicado pela prefeita Ângela
Amin em 18 de outubro, proíbe “a demissão
de cobradores, no serviço regular ou convencional,
quando o veículo estiver em controle eletrônico
de bilhetagem”. É uma garantia importante,
mas ainda insuficiente, segundo o Sindicato dos Trabalhadores
do Transporte Coletivo Urbano de Florianópolis
e Região - Sintraturb. Os sindicalistas questionam
até quando essa legislação terá
vigência; por que não foi criado um projeto
de lei, e sim um decreto que pode ser cancelado a qualquer
momento, e que garantias serão mantidas para
a categoria.
O volume da voz do administrador do Setuf (Sindicato
das Empresas de Transporte Urbano de Passageiros de
Florianópolis), João Savas, fica mais
alto quando se tenta conversar sobre o possível
desemprego de cobradores e motoristas. “Esse assunto
de demissões para nós não existe,
não sei por que o pessoal gosta tanto de falar
disso”, protesta. Ele baseia-se no decreto da
prefeitura para garantir que “o novo sistema não
vai causar demissões”.
Segundo cálculos do sindicato, a catraca eletrônica
não é a única ameaça aos
empregos. Julcemar Guilardi, diretor de Imprensa e Comunicação
do Sintraturb, diz que para o novo sistema conseguir
desafogar o trânsito da capital, a nova frota
terá 60 ônibus a menos que a atual. Em
cada veículo trabalham três cobradores
e três motoristas, cada um num turno de 06h40
minutos por dia. Com a diminuição prevista,
360 profissionais ficariam desempregados.
Outra questão levantada pelo Sintraturb está
relacionada aos novos ônibus articulados e biarticulados
que estão previstos para ser adotados no sistema.
Os primeiros, que hoje já são utilizados
na linha Expresso, entre o centro e a UFSC, levam o
mesmo número de passageiros que dois ônibus
normais. Os biarticulados, três. No primeiro caso,
seis profissionais por dia conduzem o número
de passageiros que, em dois ônibus normais, exigiriam
o dobro, seguindo a mesma lógica. Nos biarticulados,
seis trabalhadores por dia rendem o mesmo que 18 trabalhando
em ônibus convencionais. Resumindo: para cada
ônibus biarticulado, há 12 desempregados
em potencial; para cada novo articulado, são
seis.
“Você pode ter certeza que as projeções
do Sintraturb não são confiáveis,
porque somos nós que fazemos o planejamento”,
diz Rodolfo Philippi, engenheiro do Núcleo de
Transportes da Prefeitura,. Ele afirma que não
há previsão de uso de ônibus biarticulados
e que só em janeiro será o núcleo
anunciado o tamanho da nova frota e quantos ônibus
biarticulados serão usados. “O novo sistema
não necessariamente vai reduzir a frota. Vai
racionalizar seu uso”, prevê Philippi.
Onde deu certo - Em Caxias do Sul, ao invés
de desemprego, o novo
sistema de transporte coletivo gerou contratações.
Conforme Juliano de Ros, diretor técnico da secretaria
de transportes da cidade, o modo como as linhas foram
integradas permitiu um aumento na frota de ônibus
e, conseqüentemente, dos empregos de motoristas
e cobradores. O sistema da cidade gaúcha não
é baseado em terminais de integração.
Na mesma lei, de 1999, que determinou a licitação
pública para instalar o novo sistema, foi garantido
que nos ônibus que operassem com catraca eletrônica
haveria necessariamente dois profissionais, o que garantiu
o emprego aos cobradores, agora chamados de “auxiliares
operacionais”.
Em Chapecó, distante 576 quilômetros de
Florianópolis, não houve aumento de vagas,
mas as catracas eletrônicas também não
causaram desemprego. Assim como em Caxias do Sul, os
cobradores tiveram o emprego garantido por decreto e
foram transformados em “auxiliares de bordo”:
orientam o uso do cartão, controlam entrada e
saída de passageiros e auxiliam motorista, gestantes,
idosos e deficientes físicos. As catracas eletrônicas
já foram instaladas em 60% da frota de Chapecó.
O novo sistema viário da cidade ainda está
em fase de estudo.
Luta - Julcemar Guilardi
é o representante do Sintraturb no Conselho Municipal
de Transportes, do qual também participam o Setuf,
entidades comunitárias, IPUF e Câmara de
Vereadores. Segundo ele, o discurso dos representantes
das empresas tem mudado nos últimos meses. Guilardi
diz que quando o projeto foi anunciado, as demissões
eram dadas como inevitáveis, mas agora as empresas
admitem que é necessário remanejar para
outras funções os trabalhadores que seriam
demitidos.
Um dos motivos desta conscientização seria
a campanha que o sindicato está promovendo desde
junho. Por meio de reuniões com comunidades,
debates, participação em audiências
públicas e publicação do Jornal
do Ônibus, os envolvidos com a campanha pretendem
discutir o futuro do transporte coletivo e convencer
sociedade e autoridades de que é importante manter
o emprego dos 3,4 mil trabalhadores do setor em Florianópolis.
“Não vamos abrir mão de nenhum posto
de trabalho”, avisa Guilardi.
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