Número 1 - Ano I - Edição fechada em 29 de Julho de 2002 Florianópolis-SC
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Paracos: em ação em Antióquia, onde Uribe governou / Foto: AUCO Brasil passou a integrar o Plano Colômbia, habilitando-se a receber verbas do governo americano para o combate ao narcotráfico. “O Plano Colômbia não existe mais no papel, na forma em que foi inicialmente concebido” assegurou Asa Hutchinson, diretor da DEA, ao jornal colombiano El Tiempo. “A ajuda estadunidense para a Colômbia figura agora em um novo pacote chamado Iniciativa Regional Andina”, diz “que inclui também Peru, Bolívia, Equador, Venezuela, Panamá e Brasil”. Conforme o Departamento de Estado americano, no final de dezembro do ano passado, o Congresso aprovou uma verba de US$ 660 milhões para “operações antinarcóticos na América Latina”, que deverá ser distribuída entre os sete países. Hutchinson informa ainda que o Plano Colômbia, da forma como está sendo administrado, está recebendo críticas no Congresso, por uma aparente falta de resultados. Para ele, o maior êxito até agora foi no plano judicial, onde o sistema de justiça criminal colombiano beneficia também os EUA.

O Plano Colômbia, criado em 1999 pelo presidente Andrés Pastrana, é apresentado como uma operação internacional de combate ao narcotráfico e pacificação do país. Através de uma estratégia essencialmente militar, estão previstos investimentos globais de US$ 7,55 bilhões, financiados pelos EUA, Japão, cerca de 20 países da União Européia e a própria Colômbia. A efetivação do plano começou em julho de 2000, com a aprovação, no Congresso americano, de uma ajuda de cerca de US$ 1,3 bilhões, sendo US$ 938 milhões destinados para a Colômbia e US$ 382 milhões para outros países da região. A maior parte desse dinheiro, cerca de U$ 1,1 bilhão, segundo fontes do Departamento de Estado americano, será destinada à guerra. O apoio também inclui a concessão de aviões e helicópteros. A etapa seguinte do processo prevê mais US$ 625 milhões para sustentar os programas, além de “proporcionar treinamentos, equipes e apoio de inteligência às Forças Armadas colombianas”. Em outubro de 2000 a União Européia concedeu US$ 300 milhões para “apoiar os esforços de paz do governo Pastrana”.

O combate às forças guerrilheiras e aos paramilitares também ganhou nova conotação, desde que foram considerados forças terroristas pelos EUA e, depois dos atentados de 11 de setembro de 2001, pela União Européia. As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) e o Exército de Libertação Nacional (ELN) já eram considerados terroristas pelos americanos desde 1997 e, no início deste ano, foi incluída a Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC), mais conhecidos como paramilitares. No início de junho, a União Européia, também designou as FARC como organização terrorista internacional.

No final de julho, a Câmara dos EUA deliberou que a ajuda anti-drogas seja usada também para o combate às organizações consideradas terrorristas. A lei menciona a FARC, ELN e paramilitares. Foi aprovado um pacote especial de US$ 35 milhões, sendo 25 milhões para prevenção de seqüestros, quatro milhões para reforçar a polícia e seis milhões para iniciar um programa de proteção do oleoduto nacional colombiano. No entanto, o próprio congresso aponta para a possibilidade de que a ajuda estadunidense saia do controle, e que a Colômbia se envolva em uma guerra similar à do Vietnã. O pacote deve ser aprovado pelo Senado.

Uribe: o salvador da pátriaÁlvaro Uribe, presidente eleito da Colômbia (assume dia 7 de agosto), apresentou seu Programa de Defesa, mas não explicou como vai obter o financiamento. Ele pretende duplicar os efetivos das forças armadas e policiais. Enquanto no exército passariam de 50 para 100 mil homens, na polícia passariam de 100 para 200 mil homens. Além disso, o futuro presidente pretende a adesão de um milhão de ativistas, dispostos a atuarem em frentes de segurança nos bairros e nas zonas comerciais - não sendo proibidos de usar armas legalmente adquiridas. Uribe também quer criar o “Dia da Recompensa”: toda pessoa que ajudou a força pública a evitar um ato de guerrilha ou capturar seus responsáveis, receberá uma gratificação do governo na segunda-feira seguinte. Atualmente, os gastos do governo colombiano com defesa e segurança ficam apenas em segundo lugar, tomando 12,5% do orçamento público. Perde apenas para o pagamento da dívida externa, que representou 36,9% do gasto público em 2001, enquanto a educação obteve investimentos de 4,4% e a saúde 1,7%. Quando Uribe anunciou seu novo plano de defesa, declarou que seriam necessários US$ 1 milhão de dólares por ano para o seu financiamento. Questionado sobre as fontes de arrecadação, o então candidato, sinalizou que parte dele poderia ser obtido com impostos, mas conforme observadores, “as despesas militares cresceriam tanto, que não poderiam ser facilmente cobertas por aumentos de impostos ou cortes em outras despesas”.


Estratégia militar - As ações militares no combate ao narcotráfico não se resumem à Colômbia. Os EUA montaram em território sul-americano e em ilhas próximas, nos dois últimos anos, um cordão de 20 guarnições militares, divididas entre bases aéreas e de radar, a um custo estimado de US$ 337 milhões, abrigando ao todo 1,5 mil soldados. Eles comandam três bases aéreas na região: Manta, distante 320 quilômetros da Colômbia, Rainha Beatrix (em Aruba) e Hato (em Curaçao), ambas situadas na costa da Venezuela e próximas ao Suriname - outro dos grandes corredores de exportação de cocaína. Juntas, as bases contam com 665 militares americanos.

Guilherme Navarro Jiménez, economista mexicano, assegura que os exércitos do Equador, Peru e Brasil já apóiam o Plano, sob o argumento de impedir uma invasão por parte da guerrilha colombiana aos seus territórios nacionais. Para ele, a proposta de uma ação militar conjunta entre os países de fronteira com a Colômbia, coordenada pelos EUA, começou ainda em 2000. Já foi elaborado o Plano Equador, que prevê para os americanos o livre acesso e uso da base da Força Aérea ou do Porto em Manta, “assim como instalações relacionadas com a base ou suas cercanias”. O Brasil também possui um plano de ação direta das forças armadas no conflito, chamado Plano Cobra - iniciais de Colômbia e Brasil. O deputado federal Fernando Gabeira (PT-RJ) diz que o exército brasileiro se prepara para o conflito nas fronteiras da Amazônia. “A base de Manaus é considerada a melhor do mundo em termos de treinamento de guerra na selva, o Brasil conta também com os dados de satélite on line do projeto Sivam, e uma equipe de soldados de origem indígena, que conhece muito bem as línguas e as tribos da região”.

Pontes: mais dominação / Foto: Carlos Chernij - ZeroCríticas - Na versão estadunidense, o Plano Colômbia teria como objetivos combater o narcotráfico e, mais recentemente, a guerrilha, além de instaurar a democracia na região. No entanto, existem outras versões sobre o que seriam “os reais objetivos norte-americanos”. O professor de Ciências Sociais da UFSC, Fernando Pontes, afirma que “essa intervenção é o resultado da necessidade de garantir estabilidade política e militar para um maior controle dos EUA na América do Sul”. Mas outros passos complementam esta ação. O Acordo de Livre Comércio das Américas (ALCA) seria o início da dominação econômica e política, enquanto o Plano Colômbia faria parte de uma estratégia militar. Ele explica que os EUA é o maior devedor mundial, e está à procura de novos mercados e matérias primas para evitar uma estagnação econômica em seu país. Para o professor, “o Plano Colômbia não é um fato isolado, faz parte da estratégia estadunidense mundial concernente para a região”. Pontes lembra a histórica política de intervenção militar dos EUA na América Latina, quando invadiram, só no século passado, Cuba, Haiti, Panamá, México, República Dominicana, Guatemala, Nicarágua e agora a Colômbia, além das intervenções políticas, inclusive nos governos militares de Argentina, Chile e Brasil, entre outros.
Mas há outros interesses. Na região onde o Plano Colômbia vai iniciar a guerra, Caquetá e Putummayo, existem projetos para exploração de petróleo. A embaixadora americana, Anne Patterson, admitiu recentemente que “depois de 11 de setembro, as fontes internacionais de reserva de petróleo ficaram menos seguras, e agora, mais do nunca, é fundamental a diversificação agregando as latino-americanas, até para evitar especulações sobre o aumento do óleo bruto”. A principal exploradora de petróleo na Colômbia é a multinacional Oxy, com sede em Los Angeles. Sabe-se que o governo dos Estados Unidos forneceu US$ 98 milhões para o exército colombiano proteger os oleodutos da região de Arauca, inclusive os da Oxy. Putummayo, território situado na região do sul do país, onde as lutas do Plano Colômbia serão concentradas, possui, ao lado da cocaína, um grande potencial petrolífero. Fernando Gabeira afirma que “ Os EUA estão de olho nesse potencial, e a Shell e Occidental Petroleum investiram pesado na área. Alguns ataques guerrilheiros já foram feitos contra elas, e por causa disso as duas empresas foram incentivadoras do Plano”.

Narcotráfico americano - A Colômbia produz hoje 80% da coca mundial. Da cocaína consumida nos EUA, 90% é produzida ou se origina no país e os EUA é o maior consumidor mundial da droga. A Colômbia é também a terceira maior produtora de heroína, perdendo apenas para o Afeganistão e Mianmar, e assim como a cocaína, 90% da heroína produzida na Colômbia supre o mercado americano. Ou seja, eles são os maiores consumidores do narcotráfico que dizem combater. Pontes explica que “a justificativa americana de combate ao narcotráfico na Colômbia não se sustenta, à medida que não adianta acabar com a produção sem rever o consumo. Ninguém produz, indeterminadamente, sem que o consumo não esteja assegurado”, lembra. Maurice Lemoine, correspondente do Le Monde Diplomatique na Colômbia, revela que “externalizando a Guerra Santa contra a droga, evita-se o trabalho de questionar as condições econômicas e sociais que prevalecem nas vilas e guetos norte-americanos”. Dados da ONU confirmam que 3,6 milhões de norte-americanos são viciados crônicos em cocaína. Na luta contra as drogas, os Estados Unidos gastam US$ 18 bilhões por ano, mas mesmo assim, conforme a revista britânica The Economist, 500 mil dos dois milhões de presos americanos estão detidos por crimes envolvendo drogas. Calcula-se que a indústria das drogas ilícitas movimenta anualmente cerca de US$ 400 bilhões, o que representa entre 8% e 10% do comércio mundial, perdendo apenas para a indústria do petróleo e da venda de armas.

Os Estados Unidos possuem um importante papel na produção da cocaína colombiana, como mostra Wálter Fanganiello Maierovitch, colunista da revista Carta Capital. Ele destaca o fato de a Colômbia não possuir indústrias químicas - e não se refina sem insumos químicos, que precisam ser importados. E o maior exportador de insumos para a Colômbia são os EUA. Ele também afirma que “o dinheiro da droga não é lavado e reciclado na Colômbia. Corre pela potente rede telemática da Swift - Sociedade de Telecomunicações Interbancárias e Financeiras Mundial”, que foi fundada pelos 250 maiores bancos americanos e europeus. Os aviões usados no tráfico são, quase todos, fabricados e vendidos pelos americanos. Não há fiscalização.

Leda Malysz

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