Número 1 - Ano I - Edição fechada em 29 de Julho de 2002 Florianópolis-SC
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Desde 1992, o governo colombiano realiza as chamadas fumigações, através das quais aviões lançam jatos de fumaça de compostos químicos sobre culturas teoricamente ilícitas. A fim de cumprir a meta inicial do Plano Colômbia - reduzir em 50% a produção de cocaína - a medida vêm sendo intensificada. Maurice Lemoine, correspondente do Le Monde Diplomatique, apurou que os seis últimos anos de fumigação, afetaram 110 mil hectares, com um custo anual de aproximadamente US$ 300 milhões. Apesar disso, houve crescimento na produção: dos 50 mil hectares cultivados em 1995, a cultura de coca colombiana chegou a 120 mil hectares no final de 1999. A papoula partiu do zero para atingir 6 mil hectares.

Além de não apresentar resultados efetivos, há indícios de que os químicos utilizados prejudicam a saúde dos camponeses. Lemoine conta que na vereda de Santa Inés, na região do maciço colombiano, há casos de intoxicação química. As pessoas apresentam sintomas como febre, diarréias, dores de estômago e cefaléia depois de tomarem a água que abastece a vila. O médico da cidade vizinha de Sucre, Luiz Eduardo Cerón examinou os pacientes e afirmou que “todos apresentam os mesmos sintomas, trata-se de uma intoxicação provocada por organoclorados. Não é possível fazer previsões, pois eu não a conheço”.

ONGs denunciam que o plano prevê o emprego do fungo Fursarum Oxysporum, arma biológica criada durante a guerra fria. A Acción Ecológica del Ecuador, denuncia que o fungo é mutante, se dispersa facilmente e é um dos mais daninhos que existem, provocando o ressecamento das folhas, putrefação e morte da planta, além de causar graves problemas de saúde no ser humano e poluição das águas, sobrevivendo de 20 a 40 anos. O governo colombiano desmentiu.

Sarmiento: direita dizima opositores / Foto: Carlos Chernij - ZeroArmando Sarmiento Santos, físico colombiano, doutorando em Engenharia de Materiais na UFSC, confirma que muitas famílias perderam tudo o que tinham com as fumigações “Utilizavam-se os químicos errados nas regiões erradas. Assim destruíam as plantações de mandioca, milho, batata ou fruta, dependendo da altitude”. E aponta o grave caso dos nativos de Santa Nevada, a maior reserva indígena do país, que tiveram graves alergias, e onde se verificou ocorrências de deformação nos fetos.

Quando o combate ao plantio mostra sua eficácia outros países podem se beneficiar. É o que constata o repórter Maurice Lemoine. Os peruanos, que já passaram pelo processo de erradicação da coca, parecem esperançosos com a possível queda da produção colombiana. “O anúncio das fumigações e do Plano Colômbia estimulou novamente a produção, o preço da coca subiu e, daqui a três ou quatro anos, o Peru voltará a ser, sem dúvida, um importante produtor da região”, ouviu do agricultor Ricardo Vargas, em Bogotá. A erradicação forçada, implantada na Bolívia e Peru, transferiu a plantação de coca para a Colômbia.

Plantações e narcotráfico
- Desenvolver as fumigações é uma forma, na estratégia americana, de combater o narcotráfico e as guerrilhas. No entanto, órgãos de defesa dos direitos humanos chamam a atenção para a falta de apoio aos camponeses. Afinal, se eles interromperem a produção de coca, vão necessitar de apoio do governo para estabelecer outras culturas.

A coca sustenta os agricultores colombianos. Para se produzir um quilo de cocaína, são necessários 500 quilos de folha seca. Sarmiento Santos, atesta a inoperância do governo. “Os camponeses acabam plantando coca por falta de opção. Como a maioria das regiões no interior não possuem infra-estrutura, a mandioca, milho ou frutas precisam ser levadas a cavalo até o local de venda ou até um caminhão que realiza o restante do percurso”, diz. Mas o custo desse transporte não compensa o trabalho, chega a dar prejuízo. E as cooperativas que tentam se formar, são repreendidas pelo governo, que vê nelas um núcleo da guerrilha potencial. Se os agricultores plantam coca, os narcotraficantes pagam muito bem e responsabilizam-se pelo transporte”. Sarmiento Santos diz que a guerrilha “respeita a economia da região” e não interfere, porque sabem, que de outro jeito, os camponeses iriam morrer de fome. Já com os narcotraficantes, é diferente. A guerrilha cobra a vacuna, imposto revolucionário sobre a coca comprada dos agricultores e produzida nos laboratórios. Para a acusação de que são comandantes de uma narcoguerrilha, os comandantes das FARC argumentam: “Não cabe a nós condená-los à fome erradicando suas culturas ilícitas. Além disso, as máfias ajudam o exército a financiarem os paramilitares. Por que deveríamos ser os únicos a considerar esse flagelo sob um ângulo ético? É antes de mais nada um problema econômico-social” .

Maurice Lemoine cita casos em que os camponeses tentaram se dedicar a outras culturas mas não tiveram o mínimo apoio do governo. Um deles é o dos índios yanacona, da região do Rio Blanco, que no início da década de 90 começaram a plantar papoula - já que os EUA passaram a consumir heroína além da coca. Como a violência aumentou muito na região, a ponto de o hospital não aceitar mais feridos em 1998, os índios decidiram em assembléia acabar com o plantio. Assinaram um acordo com o governo para reduzir o plantio em troca de um projeto de desenvolvimento. No final do ano não havia mais papoula na região, tampouco algum projeto. Retomaram o plantio ilícito. Na mesma época, os agricultores de Santa Cruz passaram a plantar o palmito. O preço cai pela metade e a polícia entende que, como não existe na cidade um mercado específico para frutas e verduras, não pode ser comercializado ali. Os ex-cocaleiros são expulsos por cassetetes.

A única plantação legal que consegue êxito atualmente na Colômbia é a da banana: sua produção saltou de 3.083 hectares em 1986 para 8.300 hectares em 1999 - um aumento de mais de 100% em treze anos. No entanto, pertence à iniciativa privada. Desde a abertura de seu mercado, a Colômbia perdeu 700 mil hectares de terras agrícolas. Era auto-suficiente na produção de arroz até o início da década de 90, agora importa 420 mil toneladas por ano.

O editorialista Andrés Oppenheimer afirma que “a Europa e os EUA tornam cada vez mais difícil para os países da América Latina, a exportação de seus produtos legais”. Ele acrescenta que o Plano Colômbia não destina dinheiro suficiente para auxiliar os camponeses a compensarem suas perdas.

Leda Malysz

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